Os canais de Veneza como testemunhas
Por Drica Mendes*
Durante a pandemia de Covid, a autora estreante Andreia Salles deu início a uma série de livros com todos os elementos de um bom romance de época: personagens fortes, drama, tensão e muita paixão
Em março de 2020, o mundo todo aprendia a lidar com a nova realidade de uma pandemia mundial, incluindo aí a condição do isolamento social. Muita gente se reinventou e buscou atividades fora da sua zona de conforto. Foi o que Andreia Salles, jornalista carioca radicada em Brasília, fez ao colocar no papel antigas ideias de trazer à luz um romance de época, ambientado em Veneza do século XVI. Ainda no mesmo ano, ela finalizou seu livro de estreia, A Gôndola Vermelha, e a parte II dessa estória épica, A Herança de Lucca, ambos publicados pela editora Clube de Autores.
A narrativa d’A Gôndola Vermelha nos traz a estória de Isabelle, uma francesa obrigada a se mudar para Veneza por conta de um casamento arranjado com Lucca, um nobre e muito rico cidadão da Sereníssima. A protagonista vive uma vida de luxo e solidão, até que conhece Giovanni, um gondoleiro que a tira de seu eixo. O carnaval veneziano é o cenário perfeito para deixar que essa paixão aflore. Mas nem o acaso, nem o destino podem prever o que acontecerá.
O texto equilibra uma pesquisa detalhada e cuidadosa sobre o cenário e hábitos de uma poderosa Veneza, centro comercial de um Europa pré-continental, politicamente falando, com linguagem simples, que deixa que o leitor tenha o melhor dos dois mundos, quando se transporta para um outro momento da história, mas pode se identificar com os personagens, que bem poderiam ser um amigo (ou rival), nos tempos de hoje. Pontos extras para Paola, a amiga bem relacionada e de tiradas impagáveis da protagonista e para Lucca, o truculento marido de Isabelle, que se mostra um vilão implacável.
Por vezes, é possível sentir o balanço das gôndolas e a brisa de um passeio no canal mais famoso do mundo e, em outros trechos, se inteirar sobre o impacto da política da época sobre a vida das pessoas, comuns ou da alta sociedade. Os bailes de máscara, no típico Carnaval veneziano, ganham novos elementos no imaginário do leitor.
Repleto de trechos picantes detalhando os momentos íntimos do romance de Isabelle e Giovanni, é impossível ao leitor não se envolver na estória dos dois e não torcer pelo desafortunado romance acidental, ainda que ambos não tenham medido as consequências de uma conquista de baile de máscaras e acabaram por encontrar um amor que se torna maior que a própria vida.
A Herança de Lucca
Após um final de arrepiar no primeiro volume da série, A Gôndola Vermelha, os leitores podem vencer a fase do luto e se jogar na sua continuação: A Herança de Lucca. Se o livro anterior deixa o público em meio a episódios trágicos e, aparentemente, irremediáveis, sempre há a possibilidade dos personagens possuírem truques na manga, como um plot twist já na primeira página da obra, o que já nos dá o tom da leitura desta continuação: muita ação, romance e tensão.
Após um resgate emocionante, ao estilo dos grandes clássicos do romance, Giovanni e Isabelle, acompanhados de personagens importantíssimos para a estória do casal (não vamos dar spoilers!) vão em busca de recomeço, agora longe de Veneza. A jornada conduz o leitor por lugares como Florença e Nápoles, onde conheceremos novos personagens e um estilo de vida completamente diferente para nossos protagonistas.
Para os fãs de estórias épicas e apimentadas, a série veneziana de Andreia Salles é um prato cheio. A escritora já anunciou que a sequência não termina aqui. Há a confirmação do 3º volume ainda para 2022. Preparem lencinhos e água com açúcar para se jogar no universo de Isabelle e Giovanni.
*Drica Mendes é brasiliense, escorpiana, jornalista de formação, traça de livros, cinéfila de plantão e fã de gatos. Nas horas vagas faz tricô, crochê e costura. Escreve mensalmente no Cultura Sem Censura sobre literatura.