*Por Larissa Dias
Todos nós temos nossa banda preferida, aquela que mexe com os confins do nosso coração, não é mesmo? No meu caso, sou apaixonada pela banda sueca Therion, formada no ano do meu nascimento, 1987 e que, portanto, conta com 35 anos de história no metal sinfônico!
Em todos estes anos o Therion sempre trouxe temas com as mais diversas mitologias do mundo todo e muitos temas do ocultismo e do esoterismo e, atualmente, conta com 17 álbuns de estúdio e mais 3 ao vivo, tendo como seu principal letrista Thomas Karlsson, doutor em história das religiões e um grande estudioso da mitologia mundial, além de ser fundador da ordem Dragon Rouge, que publicou o livro “Qabalah, Qliphoth e Magia Goética” no Brasil.
Porém, hoje estou aqui para falar de uma obra do Therion chamada “Beloved Antichrist”, uma ópera rock lançada em 2018 para a realização de um sonho do seu fundador Christofer Johnsson. O resultado foi uma obra com quarenta e seis canções e trinta vocalistas! Além disso, não é possível separá-la de uma ópera tradicional, pois a história tem começo, meio e fim e não se percebe a transição do canto lírico para o vocal de metal, pouco utilizado, ou das guitarras e baterias para os instrumentos clássicos. O produto entregue é simplesmente de uma beleza única e apreciativa que me trouxe lágrimas aos olhos em várias canções.
A história, para quem não conhece, pode parecer um pouco confusa e é baseada no livro “Breve História Sobre o Anticristo”, escrito pelo autor russo Vladimir Soloviev (1853-1900) e que decidi adquirir para compreender melhor a obra.
Vladimir foi filósofo, teólogo, poeta, escritor e crítico literário e escreveu um livro que conta a história de um anticristo diferente, amigo dos homens, afeito a paz entre as nações, vegetariano, amigo dos animais e com um espírito de liderança capaz de unir todas as nações do mundo com um propósito de dar uma vida boa para toda a humanidade.
Quando se lê o livro, começamos a questionar se um personagem como esse não seria, de fato, bem-vindo e necessário em um mundo como o nosso, com tamanhas desigualdades sociais, guerras, morte, fome, injustiça e tudo mais. E ainda questionamos mais: qual é o papel das religiões e da própria definição de bem e mal?
A ópera do Therion tem alguns pontos diferentes do livro, como uma história de amor entre uma jovem apaixonada e o personagem principal Seth (o Anticristo) e a luta que sua família tem para salvá-la. Porém, tanto no livro como na ópera existe uma personagem magnífica, “Apollonius”, um mago com poderes especiais, filho de uma ninfa do rio e da energia solar, que se une a Seth para ajudá-lo a governar o mundo, como seu sacerdote. Como Seth acaba sendo amado por todos, talvez a carga da “maldade” recaia sobre Apollonius, que desde o primeiro momento mostra gostar de poder.
Seth acredita ser filho do próprio Deus, mas, quando este não lhe responde como ele acreditava que deveria, o próprio Diabo diz ser seu pai e Seth, no abismo da decepção com quem acreditou a vida toda, acredita na paternidade satânica.
O que mais me impressionou é que um livro de apenas 66 páginas foi capaz de me trazer profundos questionamentos sobre a fé da humanidade, pois é uma obra que carrega em cada linha suspiros e pontos de interrogação. Ao ouvir a magnânima ópera de mais de 3 horas do Therion, terminamos com a mesma impressão, nos questionando sobre a grandeza, sobre o poder, sobre os caminhos da religião e sobre a harmonia do mundo. Os coros nesta ópera, que são “o povo”, parecem estar justamente ali para que possamos acompanhar (e ser, em algum nível) os integrantes de uma nação em ruínas, que adquire a esperança de salvação, mas que também se encontra no meio de um jogo de poder.
Particularmente, a música que mais me arrepia é “Dagger of God”, ou “Adaga de Deus”, que fala de um instrumento capaz de matar e conquistar o maligno, onde uma das cantoras traz uma voz extremamente grave e lamentosa, mostrando o peso desta magnífica arma.
Para finalizar, recomendo muito que leiam o livro e ouçam a ópera, pois nem sempre conseguimos ter duas versões de uma mesma obra de forma tão combinada e complementar, onde os estilos russos e suecos interagem de uma forma muito interessante para trazer uma visão diferente do Anticristo de Friedrich Nietzsche (1844-1900), que, no fundo, também questionava como a moral cristã, que ele considerava duvidosa, havia influenciado tanto toda a nossa cultura ocidental!
*Larissa Dias é Psicoterapeuta e Orientadora profissional, escritora e mitóloga.